sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

O Amor Mudou / 1950-2011

1950
                Eles se olharam nos olhos. Ela pensou “como este sujeito é ousado!”, e ele pensou “como esta garota é uma graça”. Era o terceiro encontro dos dois, e ele ainda não a tocara. Não tivera coragem.
                -Você é como uma rosa. Doce e linda. – falou ele, não agüentando mais segurar as palavras.
                Ela virou-se para o homem, com a boca no formato de um perfeito “o”. Esticou a mão e deu um leve tapinha no rosto dele.
                -Seu... seu... – disse ela, tentando se conter. – Se meu pai descobre!
                Estavam tomando sorvete no parque. Logo após isso, ele chegou mais perto. E mais. E mais. Até que ela virou, e seu lábios se tocaram. Mas só de leve.
                Foi o bastante para que ela sentisse o adocicado sabor do sorvete de pistache dele, misturado com algo como uma energia que a fez sentir-se nas nuvens. E, apesar de continuar achando-o ousado demais (afinal, era apenas o terceiro encontro!), pensou consigo mesma que adorou aquele beijo, e repetiria o ato, se não soubesse o que os outros falariam.
                E foi assim que eles se beijaram pela primeira vez. Um ano depois, se casaram e tiveram quatro filhos. Todos lindos.
                E, a cada vez que se beijavam, ela lembrava do doce sabor de pistache em seus lábios.

1980

                Estavam dançando, juntos. Ele sempre dava um jeito de botar a mão mais para baixo de onde deveria estar. Ela erguia a mão boba e a recolocava no lugar. Apesar de achá-lo um tanto liberal demais, estava adorando aquilo. Amava aquele jogo.
                Era a segunda vez que se viam. Toparam um com o outro na universidade, mas só aquela noite conseguiram conversar.
                Ele aproximou-se um pouco dela, fazendo o espaço entre eles diminuir. Estava demais para ela, que começou a empurrá-lo. Embora, o que mais quisesse, era poder abraçá-lo por completo.
                -Você é uma ótima dançarina. Eu adoro ótimas dançarinas.
                Ela sorriu, dando-lhe um tapinha no braço. Gostara de ouvir aquilo, mas pensava ser muito abusado.
                Em poucos segundos, ele se aproximou e lhe deu um beijo. Não um beijo qualquer. O beijo. 
                Sentiu um pouco do ponche envolver sua boca, apesar de não ter sequer provado-o. Mas aquilo era melhor do que qualquer ponche, sabia.
Afastou-se dele, fazendo cara de surpresa. Ele sorriu, e ela balançou a cabeça como se dissesse “garoto mal... eu gosto de garotos assim”.
                E foi assim que se beijaram pela primeira vez. Depois de alguns meses, se casaram e tiveram dois filhos.  Filhos maravilhosos e amados.
                Mas, mesmo depois de anos, quando o beijava, ela lembrava do sabor daquele ponche que havia sentido.

2011
                -Qual seu nome!? – gritou ele.
                -O quêêêê!? – berrou ela.
                -Qual seu NOME!? – tentou mais uma vez.
                -O QUÊÊÊ? – falou, colocando as mãos nos ouvidos.
                O som estava tão alto que não entendiam nada.
                -NOME!? – berrou mais uma vez ele, já impaciente.
                -NOM...? Ah, esquece isso! – disse ela, beijando-o com facilidade (a mesma facilidade que tivera com os outros) e pegando-o pelo braço. – Vamo logo pro quarto.
                E foi assim que eles deram seu primeiro beijo. E, na mesma noite, outra coisa. Mas, apesar disso, na manhã seguinte a mulher estava sozinha.
                Sozinha.
                Grávida.
                Sem saber como encontrar o homem.
                Sem saber nem ao menos seu nome.
                E, mesmo depois de tantos anos, ela ainda lembra o sabor quer sentiu ao acordar na manhã seguinte.
                Algo como... raiva. Muita, muita, mas muita raiva.

Nota da autora
                Alguém muito importante me disse, esses dias, que os valores mudaram. Hoje, se ama de uma hora para outra, e se odeia mais rápido ainda. Concordo plenamente. Acho que o significado do amor foi alterado.
                Não que não haja mais amor. Não é isso.
                É só que... o sabor mudou.

                By Babi

Um comentário:

  1. Amei o texto! Só acho que nasci na época errada... Deveria ter nascido em 50 ou até antes... Deveria ter sido uma personagem dos contos de Jane ou Shakespeare...

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